quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

pela Vida, na "frente" cultural

Além da "frente" espiritual, da "frente" política e da "frente" laboral, existe uma outra "frente" de combate pela "civilização da Vida" que tendemos a esquecer mas que é de capital importância: falamos da "frente" cultural.

A cultura condiciona-nos a todos de forma extremamente subtil mas poderosa. Quantas ideias e imagens interiorizadas desde o berço nos levam a agir e optar por aquela que nos parece "a única opção possível", achando que "as coisas são assim mesmo"? Quantas ideias vamos mantendo aguerridamente aquarteladas em regiões do cérebro aonde, supostamente, a razão não entra? Porque não nos passa pela cabeça abrir à Razão as portas da obscura região do preconceito?

Porque discernimos o bem mas acabamos por seguir o mal? Video meliora proboque, deteriora sequor.

Por causa de uma cultura de estigmatização da "mãe solteira" ou do "pai solteiro", da mancha no "bom-nome da família", da "imagem pessoal" há milhares de bebés portugueses que poderiam nascer (porque os progenitores têm condições para isso) e são abortados. Então é preciso tomar consciência de que esta nossa cultura tem hoje uma lado assassino e é preciso mudá-la. E neste domínio já não estamos num combate de ideias entre os paladinos do movimento pro Vida e os activistas pro-aborto. Esta já é uma luta interior em que se defrontam o nosso idealismo contra o nosso próprio egoísmo; alguns elementos da nossa tradição cultural e a análise crítica da razão, do Logos. Este é talvez o mais duro combate... contra o bárbaro "pró-aborto" que ainda subsiste em cada um de nós que proclamamos o Valor Absoluto da Vida Humana. Talvez um primeiro passo para a sua erradicação possa ser a simples consciencialização da existência dessa 5ª coluna.

Certa estudante universitária, tendo engravidado, perante o abandono do "companheiro" e a necessidade de arranjar emprego imediato, decidiu interromper o seu curso. Teve o filho e o emprego permitiu-lhe enfrentar as dificuldades. O sentido de responsabilidade aguçado na luta da Vida (literalmente) e demonstrado também nas tarefas profissionais, levou-a a conquistar a confiança da administração e a uma rápida ascensão na empresa. Alguns dos antigos colegas, tendo concluído o curso no tempo normal, vieram a ingressar mais tarde na mesma empresa, ficando sob sua chefia. Outros, ainda, candidataram-se e não foram admitidos - os quadros haviam enchido. Certo dia, a nossa estudante resolveu concluir as poucas cadeiras que lhe faltavam e formou-se também ela, mantendo a posição de liderança que de outro modo poderia não ter atingido.

Quem pode, pois, afirmar que "ter um bebé nesta altura", em qualquer altura, é o colapso de todos os planos de vida? Sem entrar sequer em considerações de que o novo filho pode, a prazo, tornar-se no seu único e fiel amigo, nunca se pode dizer à partida se a nova situação criada por uma gravidez "nao-planeada" não será, afinal, a miraculosa saída para o buraco existencial em que se pode estar preso sem saber!

pela Vida, na "frente" laboral

Direito à estabilidade de emprego para jovens casais

Lei dos cônjuges – pelo reagrupamento familiar

Abolição progressiva dos “falsos recibos verdes”, com o sector público a dar o exemplo

Sanção das empresas onde a uma gravidez se siga de facto a não-renovação de contrato ou descriminem/inquiram na fase de admissão as candidatas sobre o seu projecto familiar

[...] nos países nórdicos não se vê como sinal de "pouco profissionalismo" levar um filho pequeno para o trabalho se não se tem onde o deixar. E nós porque continuamos a cultivar um ambiente profissional vazio de crianças, despojado também de alegria?

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Diálogo real entre duas senhoras, numa fila para almoço, algures em Portugal:

«agora já posso engravidar e ter o primeiro filho: finalmente entrei para o quadro da empresa...»


Urge uma tomada de consciência das objecções reais que na cabeça das pessoas reais estão a criar um quadro de dramático inverno demográfico e
grande desvalorização social e cultural do estatuto de maternidade/paternidade.


segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

sob o signo da INCLUSÃO

Escrevemos na Declaração de Princípios: «O movimento aspira à máxima acessibilidade e inclusão social, prescindindo de quotas ou financiamentos particulares, apoiando-se em eventuais subvenções públicas e no trabalho voluntário dos seus apoiantes, cuja participação nas decisões políticas não será condicionada por qualquer limitação etária ou monetária.»

Mas o que entendemos afinal por "inclusão"? Ou, ao contrário, em que terrenos - antigos e novos - se coloca hoje a questão da "exclusão social" a cujo combate nos entregamos?

1. Contra a exclusão do "futuro": abolição imediata da Lei do Aborto e adopção de uma política "amiga da Vida"

2. Contra a exclusão cívica da Juventude: não-discriminação etária nos processos de decisão política

3. Contra a exclusão do "presente e passado": combate firme aos projectos de legalização da Eutanásia

4. Contra a exclusão cívica de base económica: um movimento aberto e sem quotas, em que o peso económico não se traduza em peso político, abafando a natural igualdade entre cidadãos

5. Contra a exclusão cívica do cidadão com deficiência: acessibilidade física, electrónica, pessoal

6. Contra a (geo)exclusão do Portugal interior, insular e na diáspora: subsidiariedade, igualdade de oportunidades, descentralização administrativa, discriminação positiva, acesso garantido à saúde (maternidades, centros de saúde) e à educação (escolaridade obrigatória) em todo o território

7. Contra a exclusão do centro do debate político das questões essenciais da Vida e da Família, subordinando-as ao obsoleto eixo esquerda-direita: Portugal pro Vida

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Opções

Acabo de ler e meditar um artigo do cidadão Nuno Serras Pereira intitulado "votações" onde se aponta a falácia do conhecido aforismo "vox populi, vox Dei". De facto, também os povos se enganam, também os povos podem consciente ou inconscientemente trilhar caminhos suicidas, ou - num tom camiliano - caminhos "de perdição". Já em Julho de 2007 comentavamos no cidadaniaPT sob o título "Portugal em auto-destruição"[1] um comunicado da APFN, a propósito do Dia Internacional da População, onde se apontavam alguma das causas políticas da já de si má situação actual e ainda pior tendência de evolução. No cerco de Numância os últimos celtiberos preferiram o suicídio colectivo à perda da sua liberdade perante Roma. Da mesma forma, parecem hoje os (últimos?) portugueses preferir desaparecer a continuar a sua história.

Mas será de facto assim? Não o creio. Penso, isso sim, que há um claro problema de elites em Portugal. As elites não estão a ser capazes ou "não estão para se maçar" para criar caminhos viáveis, alternativas fortes, opções credíveis. E o eleitor escolhe de entre as opções que lhe aparecem e conhece. Se não conhece o programa de um movimento, o perfil e o carácter de um candidato presidencial, ainda que ideologicamente próximo, não arrisca. O trabalho das forças instaladas nas antenas e nas redacções fica assim simplificado. Basta-lhes impedir que cheguem ao conhecimento público os "perigosos elementos subversivos" do povo pro-Vida - diria mesmo do Portugal que é pro-Vida. E se isto falhar - e sabemos que é impossível controlar sempre e controlar tudo - resta-lhes impedir que se organizem, por exemplo, num movimento político.

Porque se se organizarem, não tardarão a conquistar a parte da cidadania que lhes corresponde nos votos. E em nome de quê? Em nome das opções que tantos portugueses exigem e não têm:
- a opção de não contribuir materialmente para os abortos de Estado;
- a opção de todos os anos realizar um certo "referendo ao aborto" através de uma opção na declaração de IRS, obrigando o Estado a apoiar alternativas para as mães e, logo que possível, à revogação da Lei do aborto;
- a opção de ter filhos e constituir uma família sem os ónus que a legislação actual lhes impõem;
- a opção de educar os seus filhos segundo a sua carta de Valores;
- a opção eleitoral entre diferentes formas de pensar a comunidade e não entre diferentes consórcios concorrentes ao "bolo dos investimentos públicos"
- a opção entre o Marxismo, o Liberalismo e o Personalismo Cristão ou Doutrina Social da Igreja;

Pode afinal ser-se absolutamente pró-Vida e, em sentido democrático, também pró-escolhas. É este o caminho que o Portugal pro-Vida[2] propõe a todos os cidadãos de boa-vontade que se disponham a bater-se no campo político. É por esse projecto que nos desdobramos em contactos com grupos de jovens, grupos de leigos, etc., levando aonde nos receberem uma palavra de ânimo e um projecto de futuro[3]. Vamos dar as mãos, perder o medo e juntar o nosso nome ao Portugal do inconformismo. A América responde, segundo a sua natureza, ao 11 de Setembro. A Espanha lida como pode com o 11 de Março. O Portugal (que é) pro Vida tem, perante o mundo, a obrigação de dar igualmente uma resposta ao seu 11 de Fevereiro.

Luís Botelho Ribeiro


[1] http://cidadaniapt.blogspot.com/2007/07/portugal-em-auto-destuio.html
[2] http://portugalprovida.blogspot.com/
[3] enviar email para portugalprovida@gmail.com com o seguinte assunto: [proposta de conferência pública]

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Votações

por Nuno Serras Pereira

20. 02. 2008

Os portugueses são um povo clarividente e inteligente. Têm sempre razão quando votam e votam sempre o melhor.

Começaram por votar em quem não queria que eles concebessem filhos. E os eleitos achando-se legitimados pelo voto popular estenderam e promoveram a contracepção em todo o país.

Depois os portugueses, povo sagaz e arguto, votaram naqueles que queriam que no caso de eles conceberem filhos ao matassem antes do nascimento. E os eleitos satisfeitos com o que consideravam uma validação promoveram alegremente o homicídio em forma de aborto.

Mais tarde os portugueses, povo cuidadoso e democrático, votaram nos que queriam introduzir uma propaganda obscena e lúbrica nas escolas de seus filhos, de modo que os elegidos acharam-se no direito de lhes roubar a inocência pervertendo-os desde a mais tenra idade.

Em seguida os portugueses, povo perspicaz e esperto, votaram em todos os que queriam fazer experimentações na sua progénie. E os eleitos com a proverbial presunção da legalidade conferida pela nação promoveram a reprodução artificial seleccionando eugenesicamente os filhos, escangalhando-os, clonando-os, congelando-os, queimando-os, etc.

Algum tempo depois os portugueses, povo penetrante e astuto, votaram naqueles que queriam estropiar mais eficazmente seus filhos expandindo a liberalização do crime abominável do aborto. E os escolhidos abriram abortadouros financiados pelo Estado para evitar que diminuísse o número dos que poderão escapar com vida.

Dentro em pouco os portugueses, povo sábio e entendido, votarão naqueles que querem matá-los através da eutanásia e do suicídio assistido. E os eleitos solícitos e diligentes far-lhes-ão a vontade de muito bom agrado.

Por fim os eleitos regozijar-se-ão por não haver mais portugueses para votar.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

aborto às 11 semanas...

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Família : Futuro da Humanidade

pelo Professor Doutor Daniel Serrão *



INTRODUÇÃO


Vou falar-vos da família humana.

É muito antiga a família humana, a sua origem perde-se na história dos tempos.

Quando a inteligência humana começava a decifrar o sentido do mundo natural à sua volta, quando, neste alvorecer da autoconsciência, os seres humanos se descobriam a si próprios, como próprios, e identificavam o outro como um absolutamente outro, aberto a uma relação, tiveram os humanos duas iluminações fulgurantes e primordiais.

Primeira revelação, iluminadora: estavam no mundo natural, mas não eram obra da natureza, eram criaturas com origem numa transcendência. Na conceptualização da tradição hebraica, primeiro oral, transmitida de geração em geração, depois escrita nesse maravilhoso Livro que é o GENESIS, a transcendência é Iavé, é aquele que é em si próprio e por si próprio.

Segunda revelação, esta estruturante da vida em comum: a ligação corporal de homem e mulher, não é um banal acto instintivo, como o dos outros animais, mas é uma relação de corpos individualizados como pessoas.

O GENESIS é aqui muito claro: Deus criou o homem à Sua imagem, criou-o à imagem de Deus; ele os criou homem e mulher.”O eminente biblista português António Couto, recentemente elevado à dignidade episcopal, diz que serem imagem e semelhança de Deus é terem sido criados homem e mulher, portanto com capacidade criadora, como Deus é criador.

É esta relação entre homem e mulher, a um tempo corporal e pessoal, que constitui a verdadeira essência da Família Humana.

É esta relação corporal e espiritual, entre um homem e uma mulher que transforma a Família Humana na mais grandiosa e perfeita estrutura na qual assenta a sobrevivência biológica da espécie e na qual se realiza, em toda a sua plenitude, a natureza espiritual dos seres humanos.

É na estrutura da Família Humana que a delicada e ainda misteriosa síntese entre corpo e espírito, esta unidade substancial que cada um de nós é, se realiza plenamente.

Porque a família humana não é feita com corpos sem vida espiritual, nem com espíritos a existirem desincarnados.

É feita com seres humanos que são unidades substantivas de corpo e de espírito. Corpo e espírito que ambos são obra amorosa de Deus Criador.

1 - Evolução temporal da estrutura familiar

De uma forma sucinta vou expor-vos como a família terá evoluído, no tempo, até se tornar num grande valor para as pessoas e para as sociedades.

A investigação antropológica, que procura encontrar os vestígios do processo evolutivo da hominização, admite que durante milénios a ligação macho/fêmea nos hominídeos era puramente instintiva e corporal e estava ordenada pela lei geral de todos os animais, nos quais há uma forma corporal masculina e outra feminina, que é a lei da sobrevivência da espécie.

A esta conclusão, fria e eticamente neutra dos antropologistas, contraponho a Fé bíblica num acto constantemente criador da vida, no qual está incluída a reprodução pela união dos corpos, pois esta união, sendo geradora de filhos, é a garantia da perenidade da vida desejada por Iavé. Por isto, Iavé olhando para a vida criada e sustentada considerou que tudo estava bem. Este juízo de Iavé sobre a vida criada e mantida é actual. Tem 7ª 8 mil milhões de anos, mas continua a ser proferido hoje em relação a todas as formas corporais de todas as espécies, nas quais e pelas quais, a vida se manifesta no mundo.

Os cientistas regozijaram-se recentemente por terem descodificado a grande molécula de ADN que constitui o genoma de animais e plantas. Mas essa estrutura chamada, agora, de molécula da vida, não é de hoje, nem foi inventada por Watson e Crick há pouco mais de 50 anos. Não; há milhares de milhões de anos que ela, a molécula de ADN, cumpre com um impressionante cuidado químico, a missão de conservar e transmitir a vida, usando as mais diversas e eficazes vias formais – às quais chamamos espécies – para o conseguir.

Na minha postura pessoal de criacionista supra-darwiniano, não tenho receio de afirmar que esta molécula é um instrumento para a execução do acto criador geral de Iavé.

Temos assim que, no mundo natural, machos e fêmeas geram filhos no cumprimento de uma actividade biológica instintiva, ordenada para a manutenção das espécies às quais pertencem.

Assim o terão feito os membros da espécie Homo durante milénios.

Mas o que é que aconteceu para que nesta espécie Homo se cumprisse um outro programa que alterou radicalmente a relação macho/fêmea?

Aconteceu algo de absolutamente singular que nenhuma neuro-ciência pôde, até hoje, explicar na sua génese e na sua natureza.

Nesses homens e mulheres que viviam e sobreviviam nas inóspitas savanas – talvez na África Oriental com uma primeira migração para o Médio-Oriente – emergiu uma propriedade nova : eles passaram a reconhecer-se uns aos outros, descobriram a individualidade de cada corpo, vivo ou morto, e, finalmente, individualizaram-se a si próprios para si próprios. O auto-reconhecimento foi o esboço da nossa rica auto-consciência actual. O hetero-reconhecimento, o reconhecimento do outro como um absolutamente outro é a origem da família, é a origem desta estrutura exclusivamente humana, onde se realiza a forma particular de ser e de estar dos humanos no mundo.

A emergência da estrutura familiar a partir de bandos de seres já humanos mas ainda poligâmicos e poliândricos foi, ou deverá ter sido, contemporânea da invenção, pelos humanos, da palavra oral; e tenho dito e escrito que a primeira de todas as palavras, como instrumentos significativos, foi a palavra que representa a individualização, ou seja, o monossílabo gutural eu. Este som gutural, esta sílaba vocálica que em todas as línguas faladas representa cada um a si próprio e aos outros, transforma-se em palavra quando adquire a qualidade de um símbolo representativo e significante.

Quando cada um de nós emite este som apenas vocálico, eu, está a identificar-se a si próprio e a apresentar-se aos outros. É Pessoa e fala na primeira pessoa.

Pois bem só podemos falar de família como estrutura humana quando já há esta identificação individual e quando a união sexual não é feita apenas como união de corpos, mas como união de dois eus auto-identificados.

Cada eu vai começar por aprender muito acerca de si próprio e analisar progressivamente o que faz e o que decide fazer, porque agora já não é apenas um ser humano com capacidades cognitivas, sensitivas e sensoriais, mas um ser dotado de auto-consciência, um eu auto-consciente.

É este eu auto-consciente que vai interrogar-se sobre a sua origem e o seu destino, que vai inventar a esperança na imortalidade, preparando ritualmente os corpos mortos para a ressurreição futura, que vai intuir a realidade da existência de um Ser Supremo, transcendente, que existe por si próprio e em si próprio e não pode ser conhecido nem nomeado.

E é o eu auto-consciente, de homem e de mulher, quem vai instituir a família como estrutura para a relação eu/outro eu, na verdade, eu/tu.

Relação corporal progenitora e fecunda, sem dúvida; mas igualmente relação entre eus auto-conscientes ao nível representativo e, portanto, identificável por meio de uma palavra. A palavra que usamos, hoje, para caracterizar, tanto o conceito abstracto, como a instituição, é a palavra Família. Esta relação institui uma família.

Claude Lévi-Strauss, o grande antropologista, que viveu alguns anos com, e como, os índios Nambikwara, na Amazónia, faz uma emocionada descrição da estrutura familiar deste povo muito primitivo, mostrando bem como a relação dos corpos, deitados por terra, ao cair da noite, se transforma, e cito, na “expressão mais comovedora e mais verídica da ternura humana”.

De facto, a família, como um constructo das sociedades humanas, marca os primeiros sinais da hominização plena, como suporte de uma firme estrutura de parentalidade sem a qual, homem, mulher e filhos não poderiam ter sobrevivido nas penosas condições de vida, no mundo natural.

E também não poderiam ter evoluído até aos tempos modernos nos quais a cultura exterior simbólica substitui o vínculo à Natureza.

A narrativa hebraica, fundante do povo bíblico, descreve o mundo natural, com a vida “animal”, fácil, do Homem, chamando-lhe Paraíso ou Horta das Delícias, e mostra como macho e fêmea, depois de terem ascendido ao conhecimento, fizeram a identificação do corpo próprio e do corpo do outro - reconheceram que estavam nus, diz o GENESIS - e então, já como eus autónomos, iniciaram um diálogo, que já é humano, sobre quem era responsável pela dificuldade de terem de sobreviver com o seu próprio esforço, fora da Horta das Delícias.

O que esta metáfora quer significar é que o que os seres humanos receberam de Iavé, diríamos em linguagem moderna - que é, também, metafórica -, a sua constituição genética, não lhes vai bastar para sobreviverem. Terão de ser homem e mulher, criativos eles próprios, à imagem e semelhança de Iavé, e gerarem filhos, uns bons como Abel, outros maus como Caim, e extraírem da terra o seu sustento. Lévi-Strauss, descrevendo a vida real, actual, dos índios Nawbikwara, mostra como todo o tempo de homens e mulheres é consumido na busca, em cada dia, do alimento que podem extrair da floresta tropical e no cuidado com os filhos. A isto, apenas, se resume a vida pessoal e social destes grupos humanos que, de forma muito evidente, são agrupamentos de famílias, com regras próprias de relacionamento que não diferem, substantivamente, das que os Códigos Civis dos países civilizados fixam para a família moderna.

De facto toda a evolução social do povo hebreu é baseada na família a partir de Abraão, aquele que saiu, com todos os seus, de Ur, na Caldeia, levando consigo Sara, sua mulher, a quem Iavé permitiu que tivesse um filho, na sua velhice, filho do qual provieram, simbolicamente, todas as tribos de Israel; que, mais tarde, Moisés haveria de conduzir até à terra prometida. A genealogia hebraica de Jesus, referida no início do texto do evangelista Mateus, mostra bem como a família era a própria razão de ser e estar do povo hebraico. Ainda hoje, apesar das perseguições e mortes, um judeu pode conhecer o seu vínculo familiar e a qual das 12 tribos pertence por esse vínculo familiar.

O Cristianismo, pela sua raiz hebraica, desenvolveu ainda mais a importância da estrutura familiar. Reconhecendo, sempre, a sua origem biológica e natural, elevou a constituição da Família ao nível de um Sacramento que é celebrado, livremente, por um homem e uma mulher perante Deus, testemunhado e acolhido por um Sacerdote e festejado por todos os irmãos na Fé, parentes e amigos.

2 – A família moderna

Com a evolução das Nações para Estados de Direito, politicamente organizados e socialmente regulados por leis, a união de homem e mulher, passou a ter um enquadramento jurídico, com direitos e deveres pessoais e patrimoniais. Ou seja, passou a ser reconhecida pelas estruturas políticas e pelo Direito privado, como uma instituição.

Foi um bem, esta evolução, ou foi um mal?

Foi, em muitos aspectos, um bem. Mas trouxe consigo a raiz de muitos males.

Foi um bem sempre que as leis do Estado reconheceram que a celebração de um matrimónio livremente praticada por um homem e uma mulher, por sua livre e espontânea vontade, perante Deus e na presença acolhedora de um Sacerdote, era um acto da maior transcendência social e por isso era acolhido na organização política e administrativa da sociedade, sem mais formalidades e com carácter indissolúvel – não separe o homem aquilo que Deus uniu.

Com a evolução das sociedades, em especial no mundo mais desenvolvido, a união sacramental entre um homem e uma mulher deixou de ser, por sua livre e espontânea vontade e apoiada no amor mútuo e fecundo, para passar a ser, em muitos casos, dependente de interesses familiares ou pessoais, de hipocrisia social, de mera atracção sexual, de comodidade, etc.

Então, estas uniões, não alicerçadas no mútuo amor que sobreleva a todas as dificuldades e se mantém indissolúvel e presente até ao fim da vida, estas uniões, dizia, mesmo declaradas e prometidas perante Deus como um sacramento, revelam-se, afinal, frágeis e a prazo.

Com as primeiras dificuldades, e sempre as há, ou com a infidelidade de um ou outro dos membros do casal, ou de ambos, o vínculo matrimonial dissolve-se, tanto ao nível dos afectos como ao nível corporal e os membros do casal separam-se um do outro, de facto.

O matrimónio católico é, sacramentalmente, indissolúvel e os membros do casal só podem separar-se se, de facto, não tiver havido sacramento. Para que haja sacramento são necessárias certas disposições exteriores e uma forte e clara vivência auto-consciente. Quando uma pessoa humana declara a outra pessoa humana que vai amá-la, ser-lhe fiel e respeitá-la por toda a sua vida, aconteça o que acontecer, está a assumir um compromisso que engloba a vida pessoal em todos os tempos e em todos os modos.

Se este compromisso, apresentado perante Deus, é assumido de forma leviana, insensata ou frívola, sem qualquer expressão na auto-consciência profunda de quem o assume, pode ter havido uma espampanante cerimónia pública, um banquete de luxo, um baile até de manhã, mas não existiu o sacramento do matrimónio.

Do meu ponto de vista não interessa à verdade da religião católica que a sua Igreja, em muitos Países, assuma uma elevada percentagem de casamentos católicos, como sacramentos com efeitos civis, quando um grande número desses matrimónios é dissolvido civilmente, mas sem que a dissolução civil tenha, obviamente, efeitos religiosos.

De facto, na cultura pós-moderna, particularmente depois da generalização do uso da pílula anticoncepcional pelas jovens que iniciam vida sexual activa, muito cedo e sem nenhuma perspectiva matrimonial, estabeleceu-se uma dissociação entre os relacionamentos corporais de homem e mulher e a constituição de uma família para geração e educação de filhos. A mulher, em especial a da classe média e classe média alta, adia a perspectiva de um matrimónio estável e orientado para a geração e educação de filhos, para bem mais tarde, para quando outros objectivos de carreira profissional e de desenvolvimento social tenham sido já atingidos. Até aí vivem, ela e ele, de relacionamentos dirigidos para o prazer sexual genital, ocasionais ou de curta duração, porque não têm uma perspectiva de amor autêntico, nem de fidelidade mútua, numa palavra, de matrimónio.

Esta é a situação de facto que não podemos nem devemos ignorar, por muito que nos custe

Que a Igreja Católica aceite estes casais de insensatos estouvados e se preste a recebê-los, em matrimónio, para ver, pouco tempo depois, como eles anunciam, publicamente, o seu divórcio civil, é para mim incompreensível. Pior ainda quando alegam que casaram “pela Igreja” sem saberem o que estavam a fazer e por isso pedem a nulidade canónica do primeiro matrimónio para voltarem a casar… “pela Igreja”.

Numa sociedade em que uma parte da juventude se está a afastar de qualquer prática de expressão de Fé em Cristo e na sua Igreja, a celebração do matrimónio católico só deve ser permitida aos que, comprovadamente, possuem as disposições exteriores e, principalmente, interiores, para realizarem, validamente, um sacramento e não uma banal cerimónia, mais ou menos folclórica.

Quem não sentir estas disposições não deve desejar um matrimónio católico; se, contudo, têm a intenção de constituir uma família, então, que faça um contrato civil que transforme uma união de facto num vínculo contratual, como quem cria uma sociedade comercial, que estabelece direitos e deveres entre os contratantes e destes com a sua descendência. E que pode ser anulado, por acordo entre as partes, como nos contratos comerciais de aluguer ou de compra e venda.

Mas, a todo o tempo, e como fruto de uma maturação espiritual e religiosa e de uma maior e melhor experiência da vida, estes casais em união civil estável, certamente já com filhos, podem aproximar-se da Igreja e realizarem o matrimónio sacramental, agora com a plena consciência de estarem a assumir um compromisso de amor e fidelidade para toda a vida.

Será como o baptismo de adultos ou a vocação tardia para o sacramento da Ordem ou para o carisma da vida consagrada ao Senhor. Será a elevação da natureza, mesmo degradada, à sobre natureza, em Cristo.

3 – Uma proposta para o presente em ordem ao futuro

Ao lado da anterior proposta para a pastoral do matrimónio que é, do meu ponto de vista, a mais adequada ao desregramento da sociedade pós-moderna, para a qual caminhamos, aceleradamente, na Europa, essa Europa que desdenhou colocar o cristianismo como matriz da sua origem e do seu desenvolvimento, quero apresentar uma outra, mais exigente, mas também mais empolgante para nós os que queremos implantar o reino de Cristo, na Terra.

Em muitas famílias cristãs, que vivem com alegria e felicidade o seu matrimónio pessoal indissolúvel e fecundo, o fracasso dos matrimónios católicos de suas filhas e filhos, com divórcios e posterior afastamento de qualquer prática religiosa, ou porque deixa de ser desejada ou porque não lhes é consentida pela disciplina canónica dos sacramentos, constitui uma ferida de difícil cicatrização, que perturba a convivência familiar e a integração no seio da família alargada.

O que eu proponho é que as famílias cristãs considerem o matrimónio católico das suas filhas e filhos como a sua primeira prioridade. Esta decisão tem de ser tomada e claramente assumida por Mãe e Pai que afirmam que, acima de tudo na vida, o que mais desejam é que os seus filhos e filhas tenham um matrimónio feliz, à imagem do matrimónio feliz e indissolúvel dos seus Pais.

Para realizarem esta missão, porque é verdadeiramente de missão que se trata, têm de procurar, na Igreja e fora dela, toda a informação necessária para a compreensão do mundo social à sua volta, que já não é o da sua adolescência e juventude, nem o do tempo em que namoraram e casaram. Porque a actual aceleração da história não permite que nada volte para trás. E o tempo em que os Pais viveram não volta mais.

Com estudo permanente e reflexão apurada, os Pais Católicos modernos ficarão preparados para conviverem intimamente com as suas filhas e filhos, para os acompanharem no desabrochar dos afectos, da sexualidade genital e emocional, do amor e, algumas vezes, da paixão. Esta educação que é, ao mesmo tempo, informação e formação, acontecerá informalmente na vivência familiar de todas as horas, do pequeno-almoço até desligar a televisão ao deitar, mas sempre no respeito pela intimidade que se vai construindo no filho ou filha que se desenvolve, mês a mês, sob os nossos olhos que não podem ser distraídos, mas sim muito atentos e presentes.

Que nenhuma outra preocupação se antecipe a esta que é a de construirmos filhos e filhas que hão-de ter um matrimónio feliz, mesmo que à sua volta haja adolescentes grávidas, explorações genitais nos sanitários e banheiros das Escolas secundárias, drogas em venda livre, infidelidades, pedofilia, divórcios, agressões às mulheres, até homicídios por motivos sexuais.

Mas não se trata de educar filhas e filhos numa redoma de ignorância, numa super-protecção absoluta e inútil, com proibições absurdas e contraproducentes. Tudo isto já foi tentado e falhou.

Estamos num mundo diferente onde há excesso de informação a todos os níveis e um enorme défice no processo de transformação dessa informação em conhecimento individual. A ajuda dos pais, como educadores pacientes e afectivos, é indispensável para que a informação se transforme em conhecimento pessoal, mas o protagonista para o conhecimento é o filho ou filha, não é o pai ou a mãe.

Porque a família católica não é, nem quer ser, uma estrutura de poder; mas é, e quer ser, uma estrutura mútua de serviço entre os seus membros, na qual os filhos e filhas devem sentir-se livres para perguntar, intervir, criticar e aprender.

As famílias católicas que queiram fazer da felicidade matrimonial dos seus filhos e filhas o seu objectivo principal e prioritário, têm de estar conscientes dos três componentes que garantem o sucesso na prossecução deste objectivo. São eles: conhecimentos, verdade e tempo.

Conhecimentos sólidos e modernos sobre o desenvolvimento corporal, sexual e mental que os seus filhos e filhas vão apresentando ao longo do tempo. Informação bastante e segura sobre a adolescência e o fenómeno psicológico do enamoramento, que actualmente aparece muito mais cedo e é, por vezes, avassalador.

Conhecimentos seguros sobre como estar próximo das filhas e filhos, como agir, como lhes dar espaço, como estar presente ou ausente, como interpretar os sinais, como saber ouvir, como gerir o silêncio, as manifestações de afecto, as palavras.

A regra de ouro é não improvisar nunca, em nenhuma situação.

O segundo componente é a verdade.

Não há nada mais eficaz e apropriado para destruir um processo educativo do que a hipocrisia.

Quando os Pais abraçam este programa de tudo fazer pela felicidade matrimonial de seus filhos e filhas, a verdade tem de ser o clima total da sua própria vida familiar.

É necessário que os filhos e filhas, olhando para os seus Pais, possam dizer como os Romanos diziam dos primeiros cristãos: vede como eles se amam. E este amor entre o Pai e a Mãe tem de ser verdadeiro e não um teatro representado para filho ou filha ver.

Deste amor verdadeiro e concreto de Pai e Mãe, nos dias melhores e nos dias piores, nas horas tristes e nas horas alegres, emana para as filhas e filhos uma mensagem poderosamente educativa, mais forte do que milhares de palavras. As refeições em comum, as festas de aniversários familiares, as grandes celebrações natalícias e pascais, são tudo momentos de expressão do amor que une Pai e Mãe, que as filhas e filhos recebem e nunca mais esquecem. E os que tiverem veia literária hão-de evocá-las, nos seus escritos, trinta ou quarenta anos depois, mostrando, até sem o dizerem explicitamente, como elas influenciaram a sua vida e formaram o seu carácter.

O terceiro componente é o tempo.

Não temos tempo para isso, dizem-me alguns Pais. As Irmãs do Colégio e as Catequistas da Paróquia vão fazer deles bons meninos e meninas. Que ilusão perigosa e enganadora.

Nada nem ninguém pode substituir, com sucesso, o Pai e a Mãe na formação dos afectos e na educação para uma sexualidade saudável.

O Colégio pode ensinar-lhes disciplinas científicas e boas maneiras à mesa. A catequista dar-lhes-á umas noções de religião ao nível da Escola Primária. Mas nada disto tem a ver com a educação e a preparação de uma pessoa para amar outra pessoa de sexo diferente e ser-lhe fiel.

O terceiro elemento é, de facto, o tempo.

O amor é o maior mistério da humanitude dos seres humanos. Para o descobrir, o sentir e o conservar é preciso vê-lo realizado naqueles que se amam e a família é o espaço mais adequado para esta experiência de ver o amor. Mas para que os Pais possam mostrar o seu mútuo amor é necessário tempo de permanência junto dos filhos e filhas.

Quando um casal, seriamente empenhado nesta tarefa de preparar futuros matrimónios felizes para as suas filhas e filhos, identificar qualquer actividade que lhes tira o tempo de estarem um com o outro e ambos com os filhos, deve avaliar, corajosamente, se essa actividade é indispensável ou se pode ser mudada, substituída, adiada ou eliminada.

Sem tempo não haverá disponibilidade, sem disponibilidade dos Pais não se criará nos filhos e filhas, a naturalidade e a confiança indispensáveis para o diálogo e a vivência dos afectos.

É um programa difícil, mas a recompensa de ver, nas nossas famílias, os filhos e filhas com um matrimónio católico, feliz e indissolúvel, compensará de todos os sacrifícios…que nem sacrifícios foram, mas sim actos de amor.

Mesmo que estas famílias sejam uma ilha, cercada de infidelidades, violências e divórcios, elas serão um farol orientador, um exemplo a seguir, um sucesso a conquistar, por todos quantos se preocupam com a felicidade futura dos seus filhos e filhas.

Conhecimentos, verdade e tempo, são tudo o que necessitamos para esta tarefa de preparar os jovens para a vivência do amor autêntico no interior das famílias católicas.

E, também, da Graça do Espírito Santo que Cristo prometeu enviar a todos quantos mereçam recebê-la e que não faltará às famílias empenhadas nesta missão, a um tempo salvadora e reparadora.

Epílogo

João Paulo II, o Papa de quem guardo uma saudade profunda por oito encontros pessoais de deslumbramento e mistério, escreveu, na sua Carta sobre o Evangelho da Vida, estas palavras luminosas:

“Vasto e complexo é, portanto, o serviço ao Evangelho da Vida. Ele manifesta-se cada vez mais como meio precioso e favorável para uma efectiva colaboração com os irmãos das outras Igrejas e Comunidades eclesiais na linha daquele ecumenismo das obras que o Concílio Vaticano II, com autoridade encorajou. Além disso o referido serviço apresenta-se como espaço providencial para o diálogo e colaboração com os seguidores de outras religiões e com todos os homens de boa vontade: a defesa e a promoção da vida não são monopólio de ninguém, mas tarefa e responsabilidade de todos. O desafio que temos pela frente é árduo: somente a cooperação e o acordo de todos aqueles que acreditam no valor da vida poderá evitar uma derrota da civilização com consequências imprevisíveis”.

Tenho dito, porque estas palavras dizem tudo.

DANIEL SERRÃO

* comunicação ao «I Congresso Internacional em Defesa da Vida», realizado no Santuário Nacional de Nossa Senhora da Conceição Aparecida em São Paulo – Brasil, de 6 a 10 de Fevereiro de 2008 (transcrição amavelmente autorizada pelo autor)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Moratória sobre o Aborto - proposta enviada às Nações Unidas

A Vossa Excelência Dr. Ban Ki-Moon – Secretário Geral das Nações Unidas

A Vossas Excelências Primeiros-ministros e Chefes de Estado das Nações Unidas


Nos últimos sessenta anos foram tomadas medidas notáveis e feitos relevantes esforços para a criar e suster os instrumentos jurídicos direccionados à protecção dos ideais expressos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada a 10 de Dezembro de 1948 em Paris. Nas últimas três décadas foram feitos mais de mil milhões de abortos, com uma média anual de cerca de cinquenta milhões de abortos. Segundo o último relatório do United Nations Population Fund, na China dezenas de milhões de nascituros correm o risco de aborto, incentivados e coagidos, em nome de um planeamento familiar e demográfico estatais. Na Índia, por uma selecção sexista, em vinte anos foram eliminadas milhões de crianças antes do nascimento. Na Ásia, o equilíbrio demográfico foi posto em causa por um infanticídio em massa, que está a tomar enormes proporções. Na Coreia do Norte, o risco de aborto selectivo tende à eliminação radical de todas as formas de deficiência. Mesmo no Ocidente, o aborto tornou-se o instrumento de uma nova eugenia que viola os direitos do nascituro e a igualdade entre os homens, afastando o diagnóstico pré-natal da sua função de preparação para o acolhimento e de tratamento do nascituro e, assim, aproximando-se do critério de melhoramento da raça, destruindo pois os ideais universais que estão na origem da Declaração Universal de 1948.


Submetemos à Vossa atenção um pedido de moratória das políticas públicas que incentivam todas as formas de escravidão injustificada e selectiva do ser humano durante o seu desenvolvimento do seio materno, mediante o exercício de um poder arbitrário de aniquilamento, violando o direito a nascer e o direito à maternidade. O artigo 3º da Declaração Universal afirma que “todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança da própria pessoa”. Pedimos aos representantes dos governos nacionais que se exprimam favoravelmente a uma alteração significativa ao texto da Declaração: depois da primeira vírgula, a inserção de “desde a concepção até à morte natural”. Na realidade, a Declaração Universal refere-se aos direitos humanos “iguais e inalienáveis” e proclama solenemente que os seres humanos têm uma “dignidade inerente a todos os membros da família humana” (Preâmbulo). A ciência – algumas das maiores descobertas a nível genético são posteriores à Declaração – documenta, de modo irrefutável, a existência de um património genético humano no embrião, um património único e irrepetível, desde o primeiro estádio do seu desenvolvimento. Em 1984, a Comissão britânica Warnock faz do décimo-quarto dia da concepção o limiar para além do qual um embrião não é apenas um ser humano, mas é titular do direito a não ser manipulado experimentalmente. Os governos devem preservar e proteger estes direitos naturais, que incluem o direito a um “património genético não manipulado”.


A Declaração de 1948 foi a resposta do mundo livre e do direito internacional aos crimes contra a humanidade, julgados três anos antes em Nuremberga. Em 1948, a World Medical Association adoptou a Declaração de Genebra como resposta à prática eugénica dos médicos nazis, na qual se afirma: “Respeitarei a vida humana desde o momento da concepção”. O artigo 6º da International Covenant on Civil and Political Rights, desejada pelas Nações Unidas em 1966, estabelece que “todo o ser humano tem um inerente direito à vida”. O aborto selectivo e a manipulação selectiva in vitro são hoje a forma principal de discriminação com base eugénica, racial e sexual relativamente à pessoa humana. A mesma pessoa humana que as Nações Unidas tutelam ao abrigo do artigo 6º da própria carta dos direitos. Nos sessenta anos da proclamação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, é necessário renovar a nossa principal fonte de inspiração humanitária, através da alteração do artigo 3º.


Desejamos por isso chamar a atenção dos governos para um respeito profundo dos direitos da pessoa, o primeiro dos quais é o inviolável direito à vida.


Subscrevem

René Girard, antropólogo membro da Académie française

Lord David Alton, membro da Câmara dos Lordes

Roger Scruton, filósofo inglês no Bircbeck College

John Haldane, professor de filosofia na Sr. Andrews University

George Weigel, teológo e biógrafo de Karol Wojtyla e Joseph Ratzinger
Robert Spaemann, professor emérito de Filosofia na Università di Munique
Irmã Nirmala Joshi, Superiora das Missionárias da Madre Teresa di Calcutá
Paolo Carozza, membro da Comossão inter-americana para os direitos humanos
Josephine Quintavalle, directora do Comment on Reproductive Ethics
Paola Bonzi, Centro de Apoio à Vita da clínica Mangiagalli de Milão
Pierre Mertens, Presidente da Federação Internacional Spina Bifida
Jean-Marie Le Mené, Presidente da Fondation Jérôme Lejeune
Alan Craig, presidente da Christian Peoples Alliance inglesa
Richard John Neuhaus, teólogo e director da First Things
Carlo Casini, presidente do Movimento per la Vita italiano
Lucetta Scaraffia, docente de História na Università La Sapienza de Roma
Bobby Schindler, irmão de Terri Schiavo

Referendo: Expectativas e Factos

por Maria José Nogueira Pinto
Quem se lembra, há um ano, aquando do referendo do aborto, dos argumentos que se esgrimiam, das verdades absolutas que se afirmavam? Depois disso, o silêncio.

Porque será que já ninguém fala das mulheres que, recentemente, fizeram abortos ilegais nas clínicas que estão a ser investigadas? Serão presas? Serão julgadas? E se forem, contarão com uma claque de luxo ou, agora, deixam de ter importância e tornam-se descartáveis?

Porque é que se desvaloriza, apressadamente, o facto de haver mulheres que, num curtíssimo espaço de tempo, recorreram aos serviços de Saúde para fazer segundo aborto ao abrigo da nova lei? E para quê usar eufemismos quantitativos, do tipo "episódios esporádicos", sempre que os números se tornam incómodos, pelo que revelam?

Como explicar que metade das mulheres que abortam legalmente faltem à consulta de planeamento familiar? E ninguém se interroga por que razão, apesar da despenalização e de Portugal ser um dos países europeus onde mais se consome a "pílula do dia seguinte", as mulheres tomam remédios para o estômago, para abortarem?

Muito se falou, então, em Saúde Pública. Agora, que responsável vai explicar o efeito da prática repetida do aborto na Saúde Pública e no sistema de Saúde, na saúde das mulheres e no bolso do contribuinte?

É que, um ano depois, contam os factos e não os discursos, as tiradas libertárias ou a exploração do miserabilismo. E, tal como se previa, esta lei - liberalização do aborto até às dez semanas - não veio resolver esses casos, essas situações que o SIM evocou. Não acabou com o aborto clandestino, como se vê; não levou as mulheres a reflectir na vantagem de prevenir, como se vê; não as agarrou para o planeamento familiar, como se vê; não as dissuadiu de tomarem remédios para o estômago para abortarem na sua própria intimidade e solidão, como se vê.

O dr. Jorge Branco, coordenador do Programa Nacional de Saúde Reprodutiva, diz, a este propósito, uma frase lapidar "A culpa não é do sistema. Alguma coisa está errada com as senhoras..." Ora a culpa é, em grande parte, do sistema, e há muito que sabemos o que "está errado com as senhoras". Uma parte significativa destes casos é constituída por mulheres que não tiveram acesso a nada: educação, formação, informação. São subprodutos do sistema, com poucas ou nenhumas capacidades, é-lhes quase impossível gerir a sua própria vida com autonomia, formar decisões com uma liberdade responsável. Figuram nas estatísticas nacionais a propósito da pobreza persistente, da violência doméstica, do desemprego de longa duração, do aumento do consumo da droga ou do álcool. Duvido mesmo que conheçam ou tenham entendido a lei. Outras, são jovens desresponsabilizadas pelo "sistema", criadas num caldo de cultura de "direitos" sem deveres, num individualismo feroz, fruto de uma educação sem nexo de causalidade, alheadas das consequências dos seus actos.

Mas é verdade que o sistema de Saúde lhes deu tudo: passou-as à frente de mulheres verdadeiramente doentes, abriu-lhes blocos operatórios onde outras estão em lista de espera, isentou-as de taxa moderadora que uma mulher, vítima de violência doméstica, por exemplo, tem de pagar.

Depois de um segundo referendo, igualmente desertificado de eleitores, igualmente não vinculativo, fez-se a lei. Que era para ser uma mas foi outra, à boa maneira portuguesa, com a pressão de quantos admiravam mais a clínica de Los Arcos do que as leis alemãs. O aconselhamento da mulher na fase da decisão, indispensável ao exercício livre do novo direito, constituía também importante ferramenta para iniciar um processo de formação e informação e, deste modo, aproximá-la da rede de Saúde. E embora a liberalização do aborto seja uma medida totalmente desproporcionada para ensinar a mulher a usar métodos anti-conceptivos, talvez se pudesse esperar algum resultado, pelo menos neste ponto.

Para o legislador, que viu esta lei como uma requintada pincelada de modernidade, trata-se de mais um engano! Nada pior que envernizar o subdesenvolvimento humano, patente nestes factos. E para as mulheres? Um presente envenenado.

“Só acredito no que vejo? Fé e Ciência: diálogo e confronto”

Ciclo de tertúlias do CAVIM

31 de Março de 2008, 2ª Feira; 21h00

“Só acredito no que vejo? Fé e Ciência: diálogo e confronto”.

por Álvaro Balsas, SJ



Resumo:
A omnipresença da ciência no dia-a-dia das sociedades contemporâneas, em que as novas tecnologias introduzem novos hábitos e estilos de vida, bem como formas inovadoras de comunicação e de aquisição de conhecimentos, parece desafiar as concepções religiosas estabelecidas e, até, a própria concepção de Deus.

Perante este quadro cultural, à fé em Deus não parece restar outra alternativa senão a perda do direito de cidadania e a retirada para o baú das velharias. Para quê Deus, se temos ciência?



Álvaro Balsas, SJ
Nasceu na Figueira da Foz. É licenciado em Física pela Universidade de Coimbra. Foi Assistente no Departamento de Física da Universidade de Aveiro, onde prestou Provas de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica. Fez estudos de Filosofia na Universidade Católica (Braga) e de Teologia (Madrid e Berkeley), tendo obtido o grau de Mestre em Teologia Sistemática. Publicou artigos em revistas nacionais e estrangeiras, nas áreas dos Fundamentos e Filosofia da Mecânica Quântica, da Física da Matéria Condensada e da Ciência e Religião. Actualmente, prepara o doutoramento na Universidade Católica, na área de Filosofia da Ciência, sobre “interpretações ontológicas da Mecânica Quântica”.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

antigamente bombardeavam igrejas

e assassinavam sacerdotes...
... mas finalmente perceberam que seria mais eficaz um ataque sem bombas.

Em vez das igrejas, atacar a Igreja, a Família, a Dignidade da Vida Humana.

Em vez de bombas, aborto, eutanásia, casamento Gay, adopção por homossexuais, pedofilia.

(ruínas da antiga igreja de Puigcerdá, destruída pelos
republicanos durante a guerra civil de Espanha)

"Estratégia dos promotores do aborto é minar ação da Igreja"

Dom Carmo Rhoden abriu os trabalhos do Congresso em Defesa da Vida, em Aparecida

Por Alexandre Ribeiro

APARECIDA, sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008 (ZENIT.org).- Na conferência inaugural do 1º Congresso Internacional em Defesa da Vida, essa quinta-feira, no Santuário de Aparecida, o bispo de Taubaté (São Paulo), Dom Carmo Rhoden, afirmou que uma das estratégias dos promotores do aborto é minar a ação da Igreja Católica.

Diante disso, o bispo convidou os fiéis a defenderem a vida não apenas instintivamente, mas também cristãmente.

Segundo o prelado, a Igreja é por natureza promotora da vida plena, ao dar seguimento ao mandato de Jesus Cristo, que veio «para que todos tenham vida» e «vida em plenitude» (Jo 10, 10).

Dom Carmo afirmou que «nós, Igreja, escolhemos a vida, hasteando sua bandeira», e, para além disso, «pelo discipulado de Cristo, queremos assumi-la com amor».

«Não só a defendemos, mas a cultivamos em todos os níveis, em busca da felicidade, que, teologicamente, tem outro sinônimo, santidade», disse.

O bispo de Taubaté enfatizou que os cristãos devem estar à frente na tarefa da defesa da vida, dando testemunho, pois a Igreja «ama e gera a vida em Cristo».

Segundo o prelado, nos dias de hoje, a defesa da vida se torna «um desafio crescente». Dom Carmo recordou que, a partir dos anos 50, surgiram nos Estados Unidos fundações, como a Rockefeller e a Ford, dedicadas a promover o aborto como parte de uma grande estratégia de redução populacional.

«São verdadeiras centrais de formação da mentalidade pró-aborto», dotadas de «consistentes ajudas econômicas», disse o bispo, enfatizando que estes organismos internacionais têm como meta alcançar a legalização do aborto em todo o mundo até 2015.

Para conseguir esse objetivo, o bispo destacou que uma das estratégias é «minar a ação da Igreja Católica por todos os meios possíveis».

Diante dessas dificuldades, expressou Dom Carmo, a Igreja «deve reagir de modo mais incisivo e firme», especialmente na América Latina e Caribe, pois «a Igreja não é apenas um exército em defesa da vida, mas uma comunidade profética, amante da vida, que deseja transformar-se sempre mais em uma família formadora de heróis e de santos».

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Proposta «Portugal pro Vida» faz caminho...

PS: «Católicos Socialistas» lamentam que IRS pague abortos

O grupo Católicos Socialistas, constituído no interior do PS, lamentou, na quinta-feira, que o dinheiro dos impostos tenha servido para o Serviço Nacional de Saúde executar «mais de seis mil abortos».

Numa reunião em Setúbal, onde terão estado presente 32 dos «cerca de 50» membros daquele grupo, foi feito o balanço de um ano da aprovação em referendo da interrupção voluntária da gravidez, disse à Agência Lusa Cláudio Anaia, porta-voz do grupo.

Cláudio Anaia, de 35 anos, «militante honorário da Juventude Socialista», disse à Lusa que entre as principais conclusões da reunião de Setúbal está a proposta de que «na declaração de IRS, os contribuintes possam escolher (...) que o respectivo imposto não seja para interrupções voluntárias da gravidez».

Interrogado sobre poderia ser concretizada e fiscalizada essa medida, Anaia respondeu: «Não somos fiscalistas, propomos apenas que haja um espaço para essa declaração ou para dizer que se prefere que o dinheiro do imposto seja canalizado pelas instituições pró-vida.»

O grupo apurou também que, apesar da aprovação da interrupção voluntária da gravidez, «os abortos clandestinos continuam» e que «o número de mulheres portuguesas a irem a Badajoz para abortar aumentou».

Por outro lado, decidiram «apelar à nova ministra que acabe com a política de fechar maternidades no interior do país e apoiar clínicas de aborto em Lisboa».

Os Católicos Socialistas reunidos em Setúbal manifestaram a sua satisfação pelo afastamento do ex-ministro Correia de Campos, por ter permitido que as mulheres que interrompem voluntariamente a gravidez não tenham de pagar taxas moderadoras, «uma autêntica injustiça para com as pessoas que estão verdadeiramente doentes».

O grupo decidiu ainda imprimir cinco mil autocolantes irónicos com o tema «Educação sexual moderna em quatro lições» a serem distribuídas em escolas de Lisboa, Porto e Coimbra.

«Só pode ser nessas três cidades, porque os nossos recursos não são muitos», explicou Cláudio Anaia.

Os Católicos Socialistas socialista opuseram-se à lei da interrupção da gravidez e tomaram posição diferente da da direcção do partido sobre a Concordata com a Santa Sé.

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In Infovitae 791 - Terça-feira 12 de Fevereiro de 2008

cit. Lusa (08-02-2008)

Diário Digital

Portugal Diário

RTP

Aniversário de um logro

por Francisco Sarsfield Cabral

11.02.2008

O Estado passou a promover activamente o aborto até às dez semanas

Foi há um ano o segundo referendo sobre o aborto em Portugal. O Governo tinha maioria no Parlamento para fazer passar uma nova lei do aborto. Mas, tendo o "não" ganho o referendo de 1998 (com uma abstenção de quase 70 por cento, tornando não vinculativos os resultados), o PS entendeu, e bem, que politicamente não poderia dispensar um novo referendo.
Embora a participação não tenha ultrapassado os 50 por cento necessários para tornar vinculativo o referendo, há um ano venceu claramente o "sim". O que deu legitimidade política à mudança na lei.
Reconheço-o sem dificuldade, tendo votado "não". As críticas que faço ao que se passou não são uma manifestação de mau perder. Apenas protesto contra o logro a que muita gente foi levada. O grande argumento dos defensores do "sim" era a alegada necessidade de despenalizar a prática do aborto até às dez semanas de gravidez. Isto para evitar prisões (que aliás não existiam) de mulheres e a sua humilhação nos tribunais (que geralmente as absolviam). E também para reduzir o aborto clandestino, com todos os seus riscos.
A pergunta do referendo, idêntica à de 1998, era ambígua: "Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?" Esta formulação abria a porta, não à proclamada despenalização, mas à liberalização do aborto, feito a pedido, sem qualquer condicionante e pago pelos impostos de todos nós.
Após o apuramento dos resultados do referendo e festejando a vitória do "sim", o primeiro-ministro teve palavras que pareciam afastar esse risco, prometendo uma regulamentação sensata do aborto, seguindo as melhores práticas europeias. Infelizmente, o que se passou entretanto desmentiu tal ideia e confirmou os piores receios: o Estado passou a promover activamente o aborto até às dez semanas.
A lei alemã, por exemplo, prevê um aconselhamento prévio à mulher que pretenda abortar, onde se encoraja a continuação da gravidez. Por cá, tal aconselhamento foi considerado uma intolerável violação da liberdade da mulher (fraca ideia têm do que é liberdade). Esta nem sequer é obrigatoriamente informada sobre o que se passa com o feto, através de ecografias, por exemplo. Mostrar que está ali um ser vivo poderia levar a mulher a não abortar...
Os médicos objectores de consciência estão proibidos de participar na consulta prévia e no acompanhamento. E é facultativo o acompanhamento por técnicos do serviço social e psicólogos, que poderiam evitar o aborto encontrando outras soluções para a mulher.
O que se pretende é incentivar o aborto, gratuito até às dez semanas, não sendo precisa qualquer justificação: pode ser realizado apenas porque não apetece à mulher ter a maçada de uma gravidez. E o aborto a pedido não paga qualquer taxa moderadora, ao contrário de tantas intervenções médicas indispensáveis à saúde das pessoas. O aborto a pedido beneficia, ainda, do apoio da Segurança Social, idêntico ao do aborto espontâneo (salário na íntegra, sem impostos, entre 14 e 30 dias). Em Novembro afirmou o bastonário da Ordem dos Médicos que "hoje é mais fácil fazer uma IVG no Estado do que obter uma pílula contraceptiva gratuita".
Politicamente, é compreensível este empenho governamental na promoção do aborto no Serviço Nacional de Saúde. Criticado à esquerda pelas suas políticas económicas e financeiras "ortodoxas", restam as "questões fracturantes" para o Governo e o PS tentarem demarcar-se da direita. Se o PS ganhar de novo as eleições, provavelmente virão o casamento homossexual, a adopção de crianças por gays e lésbicas, etc.
Será bom que, antes da votação, o PS diga claramente o que pretende fazer nestas áreas. É que, para logro, já basta o aborto, em que enganaram os portugueses com uma alegada despenalização, quando afinal veio não só uma liberalização, como uma empenhada promoção do aborto.
Mas os esforços governamentais parecem não estar a atingir os seus objectivos: o número de abortos voluntários nos hospitais públicos encontra-se a pouco mais de metade das previsões oficiais. Uma das mais baixas taxas do mundo, um caso excepcional, segundo o coordenador do Programa Nacional de Saúde Reprodutiva (Diário de Notícias, 29.11.07).
Ironias da história.


segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Que Dizer?

por Nuno Serras Pereira

11. 02. 2008

1. Tudo o que se possa dizer passado um ano do referendo que agravou em muito a já existente liberalização do homicídio na forma de aborto será sempre nada para descrever a banalização do terror e simultaneamente a formosura do dom verdadeiro de si mesmos que move tantos corações a uma fecunda entrega gratuita. Mas o que não se pode dizer também não se pode calar.

2. a) Talvez seja bom começar por recordar que, nos idos de 1997/8, um abortófilo assumido, reputado sociólogo, cronista semanal na imprensa e comentador habitual na televisão afirmava com todas as letras não acreditar que os pró-vida reconhecessem o embrião e o feto como verdadeiros seres humanos. Isso para ele constituía uma evidência que resultava do comportamento verbal e da acção dos que se opunham ao aborto provocado. A razão era simples, se fora verdade que nós reconhecíamos o concebido ainda não nascido como um de nós, dotado da mesma dignidade e, portanto, do mesmo valor, seria óbvio que a nossa mobilização e o nosso combate nunca teriam sido tão tíbios como foram. Daqui poderemos concluir que para os abortistas e demais pessoas confusas acreditarem na verdade da nossa luta precisam que o nosso testemunho, por palavras e obras, corresponda à gravidade daquilo que está em jogo. De facto, dificilmente poderão despertar para a verdade que propomos se topam discrepância entre o que proclamamos e o que testemunhamos. Exemplo disto, ainda nos dias de hoje, é o inexplicável silêncio da Conferência Episcopal neste dia aniversário de pois do Estado ter condenado a uma morte violenta seis mil inocentes por exigência cruel de suas mães; ou a mesma conceder um prémio cultural a um sacerdote que promoveu a reprodução artificial, com o seu cortejo infindável de mortos, em Portugal; ou a Rádio Renascença manter colaboradores, como por exemplo, Edite Estrela, que publicamente advogam o aborto; ou a Universidade Católica Portuguesa ter como professor um director de um periódico que ganha dinheiro com a publicidade feita ao matadouro dos Arcos; ou os rios de dinheiro que se gastaram, e muito bem, com a construção da Igreja da Santíssima Trindade, em Fátima, e a menos que migalha insignificante que a Igreja dispensou na formação das consciências, o que é um gravíssimo pecado de omissão (queira Deus que os nossos Bispos não sucumbam à tentação de pensar que é mais importante para a Igreja gastar um extravagância com uma megalómana sede para a Conferência Episcopal do que contribuir para a defesa da vida); ou a autocensura a que muitos se impõem ao abordar estes temas – os exemplos poderiam multiplicar-se facilmente.

b) Uma vez que o espaço de um artigo deve ser breve para não enfastiar proponho-me somente lembrar a necessidade de um uso cuidadoso da linguagem que nos ajude, a nós e a todos os outros, ter bem presente a verdade do que tratamos. Por exemplo:

- Nunca dizer, IVG ou somente aborto, mas sim homicídio na forma de aborto, ou aniquilação propositada do filho ou filha;

- Nunca dizer, os do Sim, mas os abortófilos ou abortistas;

- Nunca dizer, a mulher, mas a mãe grávida;

- Nunca dizer, vou ser mãe, quando se está grávida, mas dizer sou mãe ou, consoante aquele que fala, sou pai, sou avô sou avó, etc;

- Nunca dizer, o embrião ou o feto, mas sim a pessoa, ou o ser humano, na sua etapa, ou fase, embrionária, fetal, etc.

- Nunca dizer a lei, quando se refere à violência (assim lhe chama João Paulo II, no seguimento de St.o Agostinho, que admite o aborto, mas sim a “lei” intrinsecamente injusta, ou iníqua;

- Nunca chamar democracia ao regime em que vivemos, pois isso somente seria possível caso tivéssemos uma visão relativista da vida e da política, mas sim, como ensina João Paulo II, tirania ou substancial totalitarismo;

- Nunca chamar clínicas ou hospitais ou centros de saúde aos locais onde se realizam abortamentos, mas sim matadouros ou abortadouros;

- Nunca chamar médicos aos que se dizem profissionais de saúde e que realizam abortamentos, mas sim carrascos, carniceiros, vampiros, etc.

- Nunca chamar medicamentos, aos fármacos que induzem o aborto, mas sim preparos venenosos ou peçonhentos, pílulas homicidas, etc.

- Nunca dizer procriação medicamente assistida, mas sim terrorismo de laboratórios (a expressão é de Ortega y Gasset);

- Nunca dizer experimentação ou investigação em embriões, mas dizer sempre matança nazi (ou brutal) de seres humanos inocentes, vulneráveis e indefesos;

- Nunca dizer clonagem terapêutica, mas dizer sempre produção propositada de seres humanos para os matar.

- Nunca dizer APF, mas sim Aniquilação Propositada dos Filhos/as ou Aulas

A lista podia continuar. Talvez fosse oportuno reunir um grupo de trabalho para elaborar um vocabulário. Fica a sugestão.

3. O boletim electrónico Infovitae, que está a dar os primeiros passos na comunicação por imagens, prestou um serviço importante ao colocar na Internet o conteúdo integral do balanço de um ano de maior liberalização do aborto feito por diversos movimentos pró-vida. Fica-se, por este modo, a saber o que a grande maioria dos órgãos de comunicação social censuraram. Do que se pode ver e ouvir fica uma grande alegria por tantas coisas boas que se vão fazendo e pelo entusiasmo patente na determinação dos que generosamente se têm vindo a entregar, por Cristo, a esta causa tão nobre.

Há, não obstante, alguns reparos a fazer. Aqui ficam somente dois, não porque únicos, mas por brevidade e porque as instâncias onde tratar os outros não são as deste texto.

a) Creio que o facto de neste referendo o Não ter tido mais duzentos mil votos não é de atribuir a uma campanha melhor mas tão só ao facto de a abstenção ter sido menor do que em 1998. Nesse ano, praticamente a maioria da Igreja no norte de Portugal, convencida de que iríamos perder o referendo, mobilizou com sucesso os fiéis para a abstenção. O que desta vez não aconteceu. Assim, é provável que os duzentos mil votos a mais não signifiquem um avanço nosso, mas possivelmente um retrocesso, pois não fora tal abstenção em 98 e teríamos certamente mais que esses duzentos mil, nessa altura. É preciso não esquecer que a actividade constante e sistemática dos abortófilos no período que mediou os dois referendos e a passividade escandalosa da Igreja teve um impacto negativo brutal na mentalidade dos portugueses. Acresce que a mensagem que passou para o povo quer da parte da Igreja quer da parte de uma parte significativa dos demais movimentos pró-vida foi muito ambígua dando sinais contraditórios cujo efeito muito nefasto foi bastante visível, e verificado na votação referendária.

b) Por outro lado as duas realidades mais importantes que enquanto a mim surgiram no pós-referendo foram, aparentemente, esquecidas. Em primeiro lugar, há que referir o movimento de oração intitulado Os Cercos de Jericó – parece que aqui se cumpre, pelo menos em parte, o que escrevi a 10 de Outubro de 2006: « … é absolutamente indispensável levarmos Deus a sério»; e a 11 de Novembro do mesmo ano: «Nada poderá substituir a oração e o sacrifício, em especial o jejum (para quem pode) …»; e a 5 de Janeiro do ano seguinte: «Importa muito entender que esta guerra é essencialmente espiritualporque não é contra os seres humanos que temos de lutar, mas contra os Principados, as Autoridades, os Dominadores deste mundo de trevas, e contra os espíritos do mal que estão nos céus.” [1]».

Em segundo lugar, o nascimento do projecto A Teu Lado que à porta, para já, de um abortadouro tem gente mansa e humilde rezando e dissuadindo as mães grávidas de trucidarem seus filhos realizando-se assim, de algum modo, o que escrevi a 12 de Fevereiro do ano passado: « … temos de nos preparar para, à semelhança da Virgem Maria e de S. João Evangelista, peregrinar a esses calvários acompanhando os inocentes condenados. A nossa oração e a nossa presença comunicarão, de uma forma misteriosa, a cada uma daquelas crianças massacradas que houve alguém que as amou e por elas se bateu. A nossa oração e a nossa presença pacífica e auxiliadora poderão dissuadir muitas mães de abortar. A nossa oração e a nossa presença mansa e humilde poderão converter muitos dos carrascos. A nossa oração e a nossa presença carinhosa e amparadora poderão conduzir ao arrependimento e à reconciliação de muitas das mães que abortem.».

Uma das formas de entender, em parte, a importância deste trabalho poderá ser a de perguntarmo-nos se caso um navio, cheio de passageiros, se estivesse afundando no rio Tejo, perante a indiferença geral, não acorreríamos nós, largando tudo, numa urgência, disponibilizando toda a nossa ajuda para o que fosse necessário para os salvar? Pois o que aqui se passa é semelhante, só que é pior.



[1] Ef 6, 12