Ex.mº
Senhor Presidente da
Comissão
Nacional de Eleições,
assunto:
posição do PPV sobre modificações à Lei26/99 (pluralismo
informativo)
O
PPV manifesta a mais viva preocupação em resultado de notícias
vindas recentemente a público (cf.
jornais Correio da Manhã; Público e SOL*)
de que estaria em marcha uma iniciativa da E.R.C. visando uma
alteração das regras relativas aos debates televisivos, limitando o
acesso ao debate por parte dos partidos menos votados e,
eventualmente, de cidadãos independentes.
A
democracia tem regras que, desde o tempo da Assembleia Constituinte,
foram desenhadas tendo em vista uma democracia pluralista. Um dos
pressupostos básicos de qualquer eleição é o de que o povo é
soberano e pode, se assim entender, alterar completamente a
disposição de forças num determinado órgão representativo. Por
isso, nas condições de acesso a tempos de antena, representação
de partidos nas mesas de voto, etc., sempre se fez questão de dar a
todos os partidos as mesmas condições de participação. O
histórico, aqui, nada conta – faz-se tábua rasa. Também não
podemos aceitar que – como já sucedeu em campanhas presidenciais -
às decisões de cobertura jornalística possam voltar a presidir
critérios tão arbitrários como um suposto “estatuto de figura
pública”.
Tudo
o que venha a pretender-se fazer no sentido de relativizar e degradar
estes princípios democráticos, há muito consensualizados, deve
pois ser considerado como uma ameaça à transparência democrática,
independentemente das práticas seguidas noutros países europeus –
alguns deles tão ou mais longe que nós da verdadeira democracia.
Um
outro aspecto que queremos destacar é o facto de a ERC, embora
dotada de autonomia administrativa e financeira , não possuir a
necessária autonomia política, dependendo politicamente da
“situação”, ou seja, do “bloco central” parlamentar. Neste
quadro, mandaria a “decência política” que a E.R.C. se
abstivesse de iniciativas que, além de eventualmente extravasar as
respectivas competências, pudessem servir os interesses políticos
de cuja concertação dependeu e depende a escolha da maioria dos
seus membros, por essa via, do seu próprio Presidente.
Nos
finais dos anos 70 assistiu-se à lenta e penosa submissão do poder
militar ao poder civil e eis que agora, 40 anos depois, a questão
volta a pôr-se em termos da re-submissão do poder
económico-mediático ao poder civil e democrático. A mesma
sociedade civil que mandou os militares “de volta aos quartéis”
se encarregará de mandar os jornalistas “de volta às redacções”.
Os
cidadãos têm, pela Constituição Portuguesa, direito a um completo
esclarecimento. Isto implica a possibilidade de obterem, pelo serviço
público de radio-televisão e por todos os canais disponíveis sob
concessão pública, um conhecimento objectivo dos diferentes
programas e candidatos que se apresentem a eleições. A ERC não
pode ignorar que a Constituição da República Portuguesa no seu
Capítulo II, concretamente no art. 48º consagrado à «Participação
na vida pública», o ponto nº 2 assegura a todos os portugueses o
direito de conhecer objectivamente as propostas políticas de todas
as entidades públicas - onde se incluem os partidos políticos. Ali
se pode ler «Todos
os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre
actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo
Governo e outras autoridades acerca da gestão dos assuntos
públicos.»
Parece-nos
que o sentido da proposta da E.R.C., nos termos em que veio a
público, irá ferir de forma insanável este princípio
constitucional. Julgará porventura a E.R.C. que um consenso com os
Sr.s Directores de Informação das televisões dispensa a
observância da Constituição Portuguesa? Alguma destas figuras está
acima da Lei, acima da Constituição?
Por
outro lado, a Lei n.º 26/99, de 3 de Maio, veio alargar, entre
outras coisas, a obrigação da neutralidade das entidades públicas
à data da marcação das eleições ou do referendo. Ali se refere,
no Artigo nº 2 sobre a Igualdade de Oportunidades: «Os
partidos ou coligações e os grupos de cidadãos, tratando-se de
acto eleitoral, os candidatos e os partidos políticos ou coligações
que os propõem, tratando-se de referendo, têm direito a efectuar
livremente e nas melhores condições a sua propaganda, devendo as
entidades públicas e privadas proporcionar-lhes igual tratamento,
salvo as excepções previstas na lei».
Também
no Artigo 3.º vem reforçada esta ideia impondo-se explicitamente
uma exigência de neutralidade e imparcialidade das entidades
públicas que, parece-nos, se extende à presente iniciativa da ERC,
a seis meses que estamos de novo acto eleitoral: « 1
— Os órgãos do Estado, [...], das demais pessoas colectivas de
direito público, das sociedades de capitais públicos ou de
economia mista e das sociedades concessionárias de serviços
públicos, de bens do domínio público ou de obras públicas,
[…] não podem intervir directa ou indirectamente em campanha
eleitoral ou para referendo, nem praticar quaisquer actos que
favoreçam ou prejudiquem uma posição em detrimento ou
vantagem de outra ou outras, devendo assegurar a igualdade de
tratamento e a imparcialidade em qualquer intervenção nos
procedimentos eleitorais ou referendários.
2
— Os funcionários e agentes das entidades referidas no número
anterior observam, no exercício das suas funções, rigorosa
neutralidade perante as diversas posições, bem como perante os
diversos partidos e grupos de cidadãos eleitores.»
Sendo
uma das principais atribuições da C.N.E. «Assegurar
a igualdade de oportunidades de ação e propaganda das candidaturas
a determinada eleição e dos intervenientes nas campanhas para os
referendos.»
parece-nos natural esperar que esta Comissão Nacional mantenha e
aprofunde a posição adoptada no seu comunicado de 12/04/2013, o
qual apoiamos integralmente. Pela parte do PPV, sempre nos oporemos a
que o rotativismo,
no caso entre o PSD e o PS, venha algum dia a alcandorar-se a valor
democrático de
jure
ou de
facto,
destronando o Pluralismo.
Exortamos a C.N.E. a opor-se por todos os seus meios a projectos ou
tentações anti-democráticas cuja existência esta iniciativa da
E.R.C. denuncia.
PPV
- Direcção Política Nacional,
Guimarães,
22 de Abril de 2013
*
cf. notícias jornal Sol, 12 de Abril de
2013, http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/lazer/tv--media/erc-quer-debates-na-tv e
jornal Público
http://www.publico.pt/politica/noticia/erc-promete-solucao-para-debates-eleitorais-nas-televisoes-em-dez-dias-1591012