quinta-feira, 10 de outubro de 2013

participação contra apropriação partidária das cores da bandeira nacional

Ex.mº Senhor Presidente da Comissão Nacional de Eleições,

Ex.mº Senhor Procurador-Geral Adjunto António Manuel da Rocha Ferreira Marques,

Ex.mº Senhor Procurador-Geral Adjunto José Manuel de Morais dos Santos Pais
,


O «PPV - Portugal pro Vida» verificou nas recentes eleições autárquicas que a candidatura do Partido Socialista fazia um uso, em nosso entender, abusivo da bandeira nacional - embora sem o escudo - como grafismo de fundo da sua comunicação escrita. Verificámos directamente o facto na campanha em Guimarães, onde também estavamos envolvidos. Mas estamos em crer que tal práctica do P.S. estará generalizada ou, em todo o caso, muito difundida entre as suas candidaturas autárquicas e/ou legislativas.

Em nossa opinião, tal prática viola o espírito do nº3 do artº 12º da Lei dos Partidos Políticos onde se lê que «O símbolo não pode confundir-se ou ter relação gráfica ou fonética com símbolos e emblemas nacionais nem com imagens e símbolos religiosos». Embora se possa alegar que não se trata do uso do "simbolo", parece-nos evidente que o uso destas cores visa estabelecer uma identificação consciente ou sub-consciente das candidaturas socialistas com o interesse nacional, representado nas cores da bandeira - elas mesmas, como se sabe, deliberadamente escolhidas em 1911 para identificar o país com o regime e partido republicano (P.R.P.) vitoriosos no 5 de Outubro.

Fig. 1



a)                                                        b)                                        c)

Fig. 1
a) ilustração das manifestações do P.R.P. por ocasião do "ultimato inglês" contra o "mapa cor-de-rosa"
b) bandeira nacional escolhida em 30 de Junho de 1911
c) brochura do Partido Socialista nas autárquicas 2013 em Guimarães


Num momento em que, a propósito de declarações do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, tanto se discute o grau de maturidade das democracias portuguesa e angolana, é interessante verificar como neste aspecto particular as coisas são tão semelhantes. De facto, também naquele "país irmão" um partido - MPLA - se apropria impunemente das cores da respectiva bandeira nacional angolana, induzindo nos cidadãos eleitores uma ambiguidade entre a realidade do "partido do governo" e o Estado.

 Fig. 2


.


    
               


 a)                                                                                                                                           b)

Fig. 2
a) bandeira do partido angolano MPLA
b) bandeira nacional angolana

O movimento «Espírito de Guimarães» considera que, a bem da transparência e até da decência democrática, devem os símbolos nacionais ser respeitados por todos os partidos, abstendo-se de os utilizar para benefício próprio. Nesse sentido, apresentamos uma reclamação contra esta prática do Partido Socialista. Apresentamos esta reclamação à Comissão Nacional de Eleições e ao Ministério Público junto do Tribunal Constitucional, esperando que, ainda que a mesma não produza efeitos práticos directos (ao que já estamos habituados), desperte nos visados senão um impulso de pudor, pelo menos algum receio de que este tema regresse incomodamente em próximos actos eleitorais.

Guimarães, 10 de Outubro de 2013
Luís Botelho


----------------

cf.  Lei Orgânica n.º 2/2003 de 22 de Agosto  in   http://www.parlamento.pt/Legislacao/Documents/Legislacao_Anotada/LeiPartidosPoliticos_Anotado.pdf
Artigo 12.º
Denominações, siglas e símbolos
[...]
3 - O símbolo não pode confundir-se ou ter relação gráfica ou fonética com
símbolos e emblemas nacionais nem com imagens e símbolos religiosos.


*****************************************************
*****************************************************
*****************************************************

(aqui publicamos a resposta recebida a 15.10.2013, 12h00 - via email)




Exmo. Senhor
Em resposta a comunicação de V. Exa. sobre o assunto em referência, informo que a CNE já foi chamada a pronunciar-se sobre o uso de símbolo nacional, regional ou autárquico em material de propaganda partidária, não se afigurando tratar-se do caso em apreço.
- Em 2005, a propósito da utilização de um dos elementos do símbolo nacional no material de propaganda da candidatura de Mário Soares a CNE deliberou que «não parece abusivo que os candidatos à Eleição para o Presidente da República, de cariz unipessoal, possam utilizar o símbolo nacional ou elementos deste no material de propaganda eleitoral, desde que tais fontes não sejam elas próprias a principal “mancha” do material de campanha, situação, essa sim, que podia levar à confundibilidade com materiais oficiais» (deliberação de 28 de dezembro de 2005 – ata 20)

- Em 2008, a propósito da utilização da bandeira dos Açores em material de propaganda partidária a CNE reiterou o seu entendimento nesta matéria no sentido de que “nada impede o uso respeitoso de símbolos regionais pelas candidaturas desde que a autoria do material de propaganda se encontre devidamente identificada e não sejam esses símbolos a principal “mancha” ou o tema central do material de campanha.” (cf. Deliberação de 23.09.2008 – sessão plenária n.º 119)

- Sobre a utilização de símbolos heráldicos em material de propaganda, tem sido entendimento constante da CNE «não haver impedimento legal ao uso respeitoso dos símbolos heráldicos pelas candidaturas, aconselhando contudo que o símbolo/brasão seja inserido no material de propaganda por forma a evitar confusão junto dos eleitores quanto à titularidade do meio de propaganda.
Deste modo, e ainda de acordo com o entendimento da CNE «a autoria do material de propaganda deve estar devidamente identificada e não sejam esses símbolos a principal “mancha” ou o tema central do material de campanha. Com efeito, a atividade de propaganda eleitoral deve desenvolver-se com respeito pela possibilidade de o cidadão eleitor formar a sua opinião livremente, o que pode não suceder se, pela simbologia heráldica utilizada houver uma identificabilidade entre as atuações institucionais e as condutas partidárias.»
No caso vertente, não está em causa a utilização de um símbolo nacional em material de propaganda partidária, mas a utilização de algumas das cores da bandeira nacional nesse material, afigurando-se que tal facto não constitui qualquer ilícito eleitoral.
Com os melhores cumprimentos

Ana Cristina Branco
Gabinete Jurídico

Comissão Nacional de Eleições
Av. D. Carlos I, 128-7º • 1249-065 Lisboa
Tef: +351 213923800 • Fax: +351 213953543
site: www.cne.pt • e-mail: cne@cne.pt

(Refª 6763, de 11.10.2013)





*****************************************************
*****************************************************
*****************************************************
(nossa resposta enviada a 17.10.2013)


Ex.mº Senhor Presidente da C.N.E.,

Em nome do partido PPV escrevi a V. Exª no passado dia 11, tendo entretanto recebido no dia 14 uma resposta do Gabinete Jurídico da CNE com um conjunto de interessantes informações sobre casos precedentes que já partilhei com a restante Direcção Política, embora sem saber se a resposta de dia 14  constitui efectivamente a resposta oficial da CNE à nossa reclamação. A nossa dúvida justifica-se porque as razões que nos são apresentadas... também valem para o caso das bandeiras de Angola e do MPLA. Se a posição final da CNE fosse efetivamente a que do Gabinete Jurídico recebemos, então isso significaria que também considera lícita a apropriação evidentíssima da bandeira do Estado Angolano... pelo MPLA - ou vice-versa.

A explicação alternativa para a coincidência das cores escolhidas pelo PS com as da bandeira nacional só poderia ser exactamente isso: uma coincidência. Nesse caso, façamos o seguinte exercício. Quais seriam as probabilidades de alguém - inocente e aleatoriamente - escolher para a sua comunicação exectamente as cores nacionais? Admitindo que, inspirando-se na generalidade das bandeiras partidárias ou nacionais, o designer hesitasse inicialmente entre um padrão com uma, duas ou três cores diferentes. Perguntando ao Google "quantas cores há", obtemos a seguinte lista:  vermelho, laranja, anil, violeta, amarelo , azul, verde. Se a estas juntarmos o preto e o branco, obtemos um total de 9 cores. Isto daria um total de 9 bandeiras possiveis com apenas uma cor, 9x8=72 bandeiras a duas cores diferentes e 9x8x7=504 bandeiras com três cores diferentes. Estamos, portanto, em face de uma extraordinaríssima coincidência quando verificamos que das 585 bandeiras possíveis (9+72+504), os designers do PS foram acertar em cheio na combinação de cores que constitui a nossa bandeira nacional. Extraordinaríssima, pasmosa e singular coincidência, tomar alguém de olhos completamente vendados, perfeitamente ao acaso... a bandeira nacional de entre 585 possíveis!!!

Ainda que na letra da lei se possa discutir a ilicitude do procedimento do PS - e nós entendemos que o é - se não é uma "esperteza" democraticamente reprovável a apropriação por parte de um partido das cores nacionais que nos devem representar e identificar a todos como povo unido para lá das divisões ideológicas e partidárias... então de futuro tudo nos será permitido: usar respeitosamente o hino nacional como tema da nossa campanha, mudando a letra aqui e ali - substituir respeitosamente o escudo da bandeira nacional pelo laço azul do PPV, etc, etc, etc.

Senhor presidente da C.N.E.,
Confiamos que do exposto facilmente ressaltará a conclusão evidente de que, numa Democracia madura e prestigiada, todos os partidos deveriam espontaneamente observar os limites da decência política, abstendo-se de alimentar quaisquer confusões com os símbolos nacionais. Não sendo esse o caso, a julgar pelo comportamento adoptado pelo Partido Socialista, esperar-se-ia ao menos que a publicação por parte da C.N.E. de uma recomendação ou interpretação vinculativa viesse repor a normalidade. O momento seria excepcionalmente apropriado, visto que não nos encontramos em qualquer periodo eleitoral ou pré-eleitoral.

A questão que aqui se coloca é mais de Democracia do que de estrito Direito. Merecemos e esperamos uma resposta mais que jurídica.

Saudações democráticas.

Pelo PPV,
Luís Botelho

Guimarães, 16 de Outubro de 2013